domingo, 25 de março de 2012

DISLEXIA

Dislexia
Maria Angela Nogueira Nico
Fonoaudióloga e Psicopedagoga Clínica; Diretora e Coordenadora Técnica e Científica da ABD

Histórico
Segundo Margareth Rawson (1968), a história do reconhecimento da dislexia de evolução como problema constitucional, remonta do trabalho de Berlin, que usou o termo “dislexia” já em 1872 e ainda de W. Pringle Morgan em 1896 e de James Kerr em 1897.

James Hinshelwood, em 1917, publicou uma monografia sobre “Cegueira Verbal Congênita”, quando trabalhou com adultos afásicos. Ele encontrou distúrbios infantis com sintomas similares, mas sugeriu que os problemas da dislexia seriam orgânicos, e ainda levantou a possibilidade de serem hereditários. Encontrou também mais meninos do que meninas com este tipo de distúrbio.

Nos Estados Unidos, a classe profissional que primeiro ajudou no reconhecimento da dislexia foi a de médicos oftalmologistas. Sua observações mostraram que a dificuldade não estaria nos olhos, mas no funcionamento de áreas de linguagem no cérebro: “Não são os olhos que leêm, mas o cérebro”.

Os psicólogos e educadores do início do século deram pouca importância aos distúrbios específicos de linguagem. Só se concentravam no aspecto pedagógico do problema; com exceção de Brooner (1917) e Hollingworth (1918, 1925). Ao mesmo tempo, a classe médica negligenciava o problema na sala de aula, o que contribuia para estabelecer uma grande lacuna entre a recuperação das crianças e o seu problema.

Em 1925, se iniciou em Iowa uma pesquisa sobre as causas de se encaminharem crianças para unidades de saúde mental. A dificuldade de ler, escrever e soletrar surgiu como uma das causas principais.

Foi então que surgiu como um grande interessado no campo do distúrbio de aprendizado, Dr. Samuel Orton, psiquiatra, neuroanatomista, que fez vários estudos post-mortem em cérebros humanos. Orton propôs várias hipóteses para a ocorrência da dislexia e também vários procedimentos para a redução das suas dificuldades.

Em continuação aos estudos de Orton, que atribuía a causa do problema a distúrbios de dominância lateral, encontramos Penfield e Roberts (1959), Zangwill (1960), Sperry (1964), Masland (1967), Miklebust (1954 - 1971) e atualmente Albert Galaburda, que descreveu a dislexia de forma mais complexa.

Na França há trabalhos de Varlot e Deconte (1926) e Ombredama (1937), mas não tiveram continuidade. No campo da linguagem escrita aparecem Borel Maysony, Arlet Boucier e outros. Atualmente, Jacques Melher.

Hoje, os estudos mais recentes estão no campo psiconeurológico. O Brasil também tem sua contribuição com a pesquisa sobre “A diferença dos volumes dos lobos temporais direito e esquerdo”.

Definição
“É uma dificuldade acentuada que ocorre no processo da leitura, escrita e ortografia. Não é uma doença, mas um distúrbio com uma série de características. Ela torna-se evidente na época da alfabetização, embora alguns sintomas já estejam presentes em fases anteriores. Apesar de instrução convencional, adequada inteligência e oportunidade sócio cultural e sem distúrbios cognitivos fundamentais, a criança falha no processo da aquisição da linguagem. Ela independe de causas intelectuais, emocionais ou culturais. Ela é hereditária e a incidência é maior em meninos, numa proporção de 3/1. A ocorrência é de cerca de 10% da população Mundial.”

Esta é, aproximadamente, a definição usada por Orton (1925), Herman (1959), Eisenberg, Money, Rabinovitch e Saunders (1962), Crichley, Cole e Walker (1964), Flover e Lawson (1965), Thompson (1966) e outros.

Para Jane Schulman e Alan Leviton (1978): “Um distúrbio de leitura á geralmete definido como uma discrepância de, pelo menos, dois anos entre o nível de leitura real e o nível esperado em relação à idade cronológica”. Esta definição não poderia se aplicar a uma população carente.

Há também uma definição recente de Miklebust: “É uma desordem de linguagem que impede a aquisição de sentido através das palavras escritas, por causa de um déficit na habilidade de simbolização. Pode ser endógena ou exógena, congênita ou adquirida. As limitações na linguagem escrita são demonstradas por uma discrepância entre a aquisição real e a esperada. Estas limitações derivam-se de disfunções cerebrais, manifestadas por perturbações na cognição. Não atribuídas a impedimentos motores, sensoriais, intelectuais ou emocionais, nem ensino inadequado ou falta de oportunidade”.

Diagnóstico
O diagnóstico deve ser feito por uma equipe multidisciplinar. Não somente para se obter o diagnóstico de dislexia, mas para se determinarem, ou eliminarem, fatores coexistentes de importância para o tratamento. A criança deve então ser avaliada por um psicólogo, um fonoaudiólogo, um psicopedagogo e um neurologista. O diagnóstico deve ser significativo para ospais e educadores, assim como para a criança. Simplesmente encontrar um rótulo não deve ser o objetivo da avaliação, mas tentar estabelecer um prognóstico e encontrar elementos significativos para o programa de reeducação.

É de grande importância que sejam obtidas informações sobre o potencial da criança, bem como sobre suas características psiconeurológicas, sua performance e o repertório já adquirido. Informações sobre métodos de ensino pelos quais a criança foi submetida também são de grande significação.

Segundo Elena Border, a dislexia é diagnosticada dos seguintes modos: a) por processo de exclusão; b) indiretamente, à base de elementos neurológicos; c) diretamente, à base da freqüência e persistência de certos erros na escrita e na leitura.

Em todos os diagnósticos o fato da criança não ter sido alfabetizada pelos processos comuns, ou um histórico familiar com distúrbios de aprendizagem, são importantes.

Classificação
Miklebust classifica a dislexiaem três grupos: Dislexia Visual, Dislexia Auditiva e Dislexia Mista.

Ingram (1970), realizou uma pesquisa com crianças com dificuldades de aprendizagem e dividiu-as em dois grupos: Específicos - cuja dificuldade estava limitada à leitura-escrita; Gerais - com outras dificuldades, como matemática (discalculia).

Bannatyne (1966), descreve dois tipos de dislexia: Dislexia Genética e Dislexia por Disfunção Neurológica Mínima. Ele caracteriza o disléxico genético, como tendo dificuldades em discriminação auditiva, sequenciação auditiva e associação do fonema-grafema. Já o disléxico com disfunções mínimas, teria dificuldades viso-espaciais, cinestésico-motoras, táteis e de conceitos.

Smith (1970), baseando-se na análise dos sub-testes de WISC, testou 300 crianças com problemas de leitura, identificando-as três grupos:
- 67% mostraram-se bem nos sub-testes, relacionados com habilidades espaciais e fracos na manipulação de símbolos e habilidades de sequênciação temporal.
- 15% tiveram déficits em organização espacial e perceptiva visual e coordenação viso-motora.
- 18% tiveram características dos dois grupos anteriores.

Em 1971, Elena Boorder e Miklebust, classificaram vários grupos:

Dislexia Disfonética - dificuldade auditiva, dificuldade de análise e síntese, dificuldade de discriminação, dificuldades temporais (em perceber sucessão e duração). Sintomas mais comuns: trocas de fonemas e grafemas diferentes; dificuldades com logatomas; alterações grosseiras na ordem das letras e sílabas; omissões e acréscimos; maior dificuldade com a escrita do que com a leitura; substituições de palavras por sinônimos, ou trocas de palavras por outras visualmente semelhantes (reconhece-as globalmente)

Dislexia Diseidética - dificuldades visuais, na percepção guestáltica, na análise e síntese e dificuldades espaciais (percepção das direções, localizações, relações e distâncias). Sintomas mais comuns: leitura silabada, sem conseguir a síntese; aglutinação - fragmentação; troca por equivalentes fonéticos; maior dificuldade para a leitura do que para a escrita.

Dislexia Visual - deficiência na percepção visual. Sintomas: dificuldade na percepção viso-motora; dificuldade na habilidade visual (não visualiza cognitivamente o fonema).

Dislexia Auditiva - deficiência na percepção auditiva. Sintomas: deficiente memória auditiva; deficiente discriminação auditiva (não audibiliza cognitivamente o fonema).

Segundo as escolas mais modernas e os teóricos mais atualizados em linguística, o fenômeno da linguagem escrita não é a transição da linguagem oral. Ela tem suas próprias sequências e deve ser adquirida como uma nova linguagem; antes de tudo, com aspectos semânticos enfatizados e não como simples decodificação e codificação, que requerem síntese e análise visual e auditiva, assim como discriminação temporo-espacial.

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